REPRODUÇÃO ASSISTIDA



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 REPRODUÇÃO ASSISTIDA

 

A reprodução é uma função biológica que permite a propagação da espécie. Apesar de ser algo natural, por vezes o Ser Humano depara-se com dificuldades neste campo. O conhecimento da fisiologia da reprodução humana permite hoje saber quais as causas que podem dificultar ou impedir a conceção e quais os tratamentos que estão disponíveis para o casal que deseja, mas não consegue, ter filhos. Neste trabalho falar-se-á das técnicas hoje disponíveis de reprodução assistida. Sendo a Fertilização In Vitro (FIV) a técnica de reprodução assistida atualmente mais divulgada e utilizada. Será feito um paralelismo com a MTC, ou seja, de que forma é que a Medicina Tradicional Chinesa poderá servir de apoio e como método auxiliar na FIV. Por fim serão abordados os riscos deste tipo de intervenção e será feita uma reflexão final sobre este tema. 

Existem várias técnicas de reprodução assistida das quais a mais conhecida e divulgada é a Fertilização in vitro.  


Inseminação Intrauterina ou Artificial

Consiste no depósito de espermatozoides dentro do útero. É uma técnica simples, rápida (3 a 5 minutos) e praticamente indolor. Não necessita de anestesia e os espermatozoides são depositados através de um cateter que passa o colo do útero.  

Existe ainda outra modalidade que consiste na introdução dos espermatozoides no cérvix (inseminação infracervical). Este método está indicado nos casos de esterilidade de causa masculina; quando o muco da paciente não permite que os espermatozoides alcancem o útero e naqueles casos de esterilidade sem causa aparente. O período mais eficaz da ovulação é controlado mediante o uso de medicamentos para aumentar as possibilidades de sucesso. No dia da inseminação é colhida uma amostra de sêmen (com 3 a 5 dias de abstinência sexual). Os espermatozoides são separados no laboratório após o qual se procede à inseminação propriamente dita. 

A fertilização, neste caso, é in vitro, dentro das trompas de Falópio. A percentagem de sucesso é de cerca de 20% por ciclo de tratamento, semelhante à possibilidade mensal de gestação num casal sem nenhum problema de infertilidade, podendo ser necessários mais do que um ciclo para conseguir resultados positivos. Fatores como a idade da mulher e a existência de outros problemas podem influenciar no êxito do tratamento. 


Fertilização In Vitro (FIV) 

A fertilização in vitro é uma técnica utilizada desde 1978, quando se mostrou bem-sucedida após o nascimento de Louise Brown na Inglaterra, o primeiro bebé proveta.  

A fertilização in vitro tradicional é um procedimento onde os óvulos são retirados da mulher, após estimulação ovárica e colocados juntamente com os espermatozoides do parceiro, num disco de Petri, para fecundar.  

Após a fecundação, os embriões assim formados são mantidos em uma estufa, até que cheguem ao número ideal de células para que possam ser colocados então dentro do útero da paciente. Geralmente um ou dois embriões são transferidos para o útero e os restantes são congelados para implantação em futuros ciclos.  

Esta técnica está indicada em casos de obstrução das trompas; fatores cervicais anormais; endometriose moderada ou severa; número de espermatozoides baixos; fatores imunológicos; infertilidade sem causa aparente; infertilidade após cirurgia tubária ou após tratamentos de endometriose. 

Poderá também ser utilizada em casos de mulheres que não estão a conseguir engravidar após o uso de técnicas mais simples de reprodução. O detalhe dos passos que compreendem este método será abordado mais adiante. 


Injeção Intraplasmática de Espermatozoides (ICSI)  

A técnica de ICSI surgiu em 1993. Consiste na injeção do espermatozoide diretamente no interior do óvulo, com o auxílio de um microscópio especial e de uma microagulha. Com esta técnica, basta que se tenha um único espermatozoide saudável para tornar possível a fertilização. Depois do procedimento em laboratório, a implantação segue os mesmos princípios da fertilização in vitro convencional.  

A ICSI pode ser utilizada por casais que tenham pouca quantidade ou baixa qualidade de espermatozoides; em casos de infertilidade sem causa aparente; ou mesmo quando houve falha de fertilização pela técnica convencional. 


Transferência de Gametas para as Trompas (GIFT)  

Esta técnica é semelhante à utilizada na fertilização “in vitro”, com a diferença que neste caso o processo de fertilização acontece no interior das trompas e não na estufa. É feita inicialmente a aspiração dos folículos, via vaginal. A seguir, através de laparoscopia, os óvulos são transferidos à trompa juntamente com os espermatozoides. Daí em diante o processo de fertilização segue seu caminho natural. Portanto é necessário que pelo menos uma das trompas seja saudável. Neste caso a fecundação é in vivo. 

As indicações são, infertilidade de causa imunológica, infertilidade masculina, endometriose tratada e infertilidade sem causa aparente. 

A paciente é preparada com controle e estimulação da ovulação. Após a aspiração, os óvulos são avaliados no laboratório. Os espermatozoides colhidos são também preparados, sendo separados os melhores, em laboratório.  

Concomitantemente a paciente é preparada para a vídeo laparoscopia, onde as gametas são transferidas para a trompa. A paciente permanece em repouso e recebe alta após algumas horas de observação, para recuperação depois da anestesia. A GIFT tem uma taxa de sucesso da ordem dos 25-30%. No entanto, cerca de um terço das gravidezes são múltiplas. 

Outra variação desta técnica é a Transferência intratubária de zigotos (ZIFT). Aqui, após a recolha e selecção de oócitos e espermatozoides, pelas mesmas técnicas da FIV, os gâmetas são postos em contacto in vitro, num meio de cultura adequado durante 18 a 24 horas.  

Após a fecundação, realiza-se uma laparoscopia e transferem-se o(s) zigoto(s) para as trompas de Falópio.  

Relativamente à FIV, a ZIFT tem a mesma ou pior taxa de sucesso, daí que esta técnica não seja das mais utilizadas. 


O papel da MTC nas várias fases do processo da FIV 



No período prévio à FIV, aproximadamente 3 meses antes dos intervenientes se submeterem à FIV é desejável realizarem tratamentos de acupunctura e fitoterapia a fim de que o sucesso da técnica seja maior. 

A MTC funcionaria assim como um complemento bastante útil nas várias fases do processo. No caso da mulher, a MTC pode funcionar nomeadamente na:  

- Melhoria da função ovárica e da irrigação uterina 

- Desenvolvimento de óvulos mais fortes e resistentes bem como de embriões saudáveis.   

Pesquisas demonstram que a acupunctura pode melhorar a circulação de sangue no útero, desta maneira promovendo o crescimento folicular e a implantação do embrião. Altos níveis de FSH indicam uma função ovárica deficiente. 

A MTC pode ajudar regulando os níveis hormonais e diminuindo os níveis da FSH. Fortalece o sistema imunitário e reduz do stress.  Cerca de metade das gravidezes induzidas resultam em aborto espontâneo. Um sistema imunitário forte pode evitar esta ocorrência e a acupunctura e a fitoterapia podem ter aqui um papel primordial.  

Muitos pacientes que utilizam a FIV experimentam efeitos secundários e níveis elevados de stress associados à ansiedade que todo este processo acarreta.  

A MTC pode ajudar as mulheres a ficarem mais calmas evitando ou reduzindo as contrações uterinas que podem desencadear o aborto. - dieta e estilo de vida – na MTC estes dois componentes são vistos como fundamentais na melhoria e manutenção da saúde. 

O exercício é outro componente muito importante que ajuda a aliviar o stress e a manter o corpo saudável, desta forma aumentando as hipóteses de alcançar uma gravidez.  

Alguns exercícios recomendados pela MTC são o Tai Chi, Qigong e as práticas de meditação.  

A acupunctura estando inserida na MTC vê o Ser Humano como um todo, de uma forma holística e os protocolos não podem ser uniformizados tendo que ser adaptados a cada caso. No entanto podemos destacar alguns pontos que, pela sua função, podem ser com mais segurança e efetividade utilizados.  


Assim, para as mulheres os pontos recomendados são: 



Poderão ainda ser usados pontos para tonificar o rim, fonte do Jing, yin e yang de todo o corpo, com os pontos: 

 


Período durante a FIV 

Este é o período mais importante em que ambas as medicinas ocidental e chinesa podem atuar em conjunto contribuindo para níveis de sucesso mais elevados.  

Regulação hormonal – como já foi atrás descrito, esta fase que dura sensivelmente um mês, antecede o ciclo da FIV e tem como objetivo permitir o descanso dos ovários a fim de posteriormente estes se tornarem mais responsivos ao tratamento hormonal.  


Em termos de MTC poderá ser utilizada a acupunctura e a fitoterapia com o objetivo de: 

. retificar e mobilizar o qi do fígado; 

. estimular a circulação sanguínea e fortificar o baço; 

. acalmar e relaxar a mente. 

Assim os pontos utilizados e a fórmula utilizada poderão ser: 

 

. Huo jing zhong zi fang  

(com radix angelica sinensis, radix bupleuri, radix salviae miltiorrhizae, radix albus paeoniae lactiflorae, sclerotium poriae cocos, rhizoma atractylodis macrocephalae, fructus citri aurantii, radix glycyrrhizae uralensis) 


Estimulação dos ovários – Tal como já foi atrás explicado nesta fase crucial os ovários são estimulados a produzir folículos mimetizando o papel das hormonas FSH e LH.   

A MTC pode contribuir neste período melhorando a quantidade e qualidade dos óvulos produzidos durante o crescimento folicular.  

Deste modo ela pode atuar: 

. suplementando os rins e fortalecendo o Baço;  

. nutrindo o sangue e acalmando a mente;  

. diminuindo os efeitos secundários das medicações de indução hormonal.  

Assim os pontos utilizados e a fórmula utilizada poderão ser: 

.Ding jing fang  

(com radix angelica sinensis, radix bupleuri, radix rehmannie glutinosae cozinhada, radix albus paeoniae lactiflorae, sclerotium poriae cocos, radix dioscoreae oppositae, semen cuscutae chinensis, radix codonopsis pilosulae, radix morindae officinalis, radix glycyrrhizae uralensis) 


Transferência do embrião – durante esta fase o embrião e/ou embriões são transferidos para a cavidade uterina.  

A MTC pode ajudar facilitando a dilatação cervical e relaxando o útero. Desta forma durante o processo as contrações e possíveis cólicas da paciente são minimizadas, facilitando a implantação.  

A MTC pode atuar: 

. suavizando o qi do fígado e nutrindo o sangue do coração de forma a acalmar a mente 

. fortificando o baço e tonificando o qi.  

Assim os pontos utilizados e a fórmula utilizada poderão ser:  

.Huo jing zhong zi fang já referida anteriormente e que deverá ser tomada na noite que antecede a transferência do embrião e na manhã em que ocorreu a transferência; 

O ponto 13R tem aqui a função de promover a abertura cervical para facilitar a transferência do embrião, bem como de aumentar o fluxo de sangue no útero de forma a promover o espessamento do endométrio.  

O si shen cong é utilizado para segurar o embrião e acalmar a mente.  

O ponto shenmen também tem esta função. 

O ponto auricular correspondente ao rim, nutre a essência e aumenta os níveis hormonais, o fígado e o baço suavizam o qi e nutrem o sangue. 


Monitorização da fase lútea –tal como explicado anteriormente esta fase que ocorre depois da transferência dos embriões vai depender de diversos fatores tal como o estado da parede uterina e a força do próprio embrião.  

A MTC pode ter aqui um papel fundamental nomeadamente melhorando a irrigação do útero contribuindo assim para a nidação e promovendo o desenvolvimento e crescimento do embrião. 

O relaxamento do útero é também extremamente importante para prevenir as contrações uterinas que poderão causar hemorragias e possível aborto. Nesta fase é sobretudo importante reforçar o rim, base da essência. Consoante seja mais preponderante uma situação de vazio de yang ou de vazio de yin do rim assim podemos utilizar: 

- Para o vazio de yang a fórmula An Tai Fang  

(com semen cuscutae chinensis, radix dipsaci asperi, ramulus sangjisheng, fructus corni officinalis, radix codonopsis pilosulae, radix albae paeoniae lactiflorae, fructus lycii chinensis, rhizoma atractylodis macrocephalae, radix glycyrrhizae uralensis).  


Esta fórmula permite: 


 - Para o vazio de yin a fórmula Yang Tai Fang  

(com sem cuscutae chinensis, radix rehmanniae glutinosae cozinhada, fructus corni officinalis, radix dioscoreae oppositae, radix albae paeoniae lactiflorae, tuber ophiopogonis japonici, semen zizyphi spinosae, radix glycyrrhizae uralensis). 

 Esta fórmula permite:  


Os pontos de acupunctura utilizados em ambos os casos poderão ser: 

36E (zu san li), 3R (tai xi), yintang, 20VG (bai hui). 

Pontos auriculares – shenmen, rim, a meio da zona entre o fígado e baço.  

O 36E e o 3R só deverão ser utlizados numa fase inicial logo após a transferência do embrião.  


Depois de um teste de gravidez positivo estes pontos deverão ser omitidos uma vez que podem hiper estimular a zona pélvica. 



Conclusão 

Um número cada vez maior de pessoas está a utilizar as técnicas de reprodução assistidas combinadas com a MTC. Antes de enveredar por esta via é importante antes de mais preparar o corpo e a mente de forma a alcançar um estado de saúde o mais pleno e saudável possível. A MTC pode ser uma ferramenta importante nesta fase para aumentar as hipóteses de engravidar. Ela reforça a ideia da necessidade do corpo estar suficientemente forte e equilibrado antes de se enveredar por métodos de reprodução assistida. Quando tal não acontece estas técnicas poderão ser demasiado fortes e invasivas, desequilibrando ainda mais a frágil estrutura do corpo e conduzindo a fracos resultados. Como resultado a mulher poderá não responder à estimulação hormonal ou o sistema endócrino poderá ficar exausto conduzindo a uma menopausa prematura. Por outro lado, ainda que a desejada gravidez tenha sido conseguida é ainda necessário lidar com todo o desgaste e demanda energética que tal processo acarreta. É necessário a mulher e o homem estarem o melhor preparado possível antes de se encetar o processo de FIV e a MTC, pelo que já foi exposto anteriormente, pode ter aqui um papel complementar muito importante. Acima que tudo há que planear bem e escolher as opções mais adequadas a cada caso. Por vezes, e apesar da FIV ser a técnica mais conhecida e utilizada de reprodução assistida, poderão ser utilizadas outras técnicas mais simples, menos invasivas e com menores efeitos secundários como a Inseminação Artificial por exemplo, antes de se partir logo para a FIV. A combinação das modernas tecnologias de reprodução com o ancestral conhecimento da Medicina Tradicional Chinesa pode ser uma grande mais-valia para os problemas de infertilidade que cada vez mais casais atravessam. Penso que esta é uma área em desenvolvimento e expansão com cada vez mais pessoas sensibilizadas para a integração de várias terapias para um objetivo comum – alcançar um bem-estar físico, mental, emocional e espiritual. A fertilidade é apenas um reflexo de tudo isso. 


Artigo escrito por Patrícia Butzke, editado e traduzido por Paula Madeira e publicado por Sónia Vitorino 


 




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